“As medidas adotadas pelo governo federal na área econômica em resposta à pandemia implicam grande abalo nas contas públicas”, é o que diz o advogado tributarista Guilherme Broto Follador, destacando que, entre as medidas adotadas, as principais são a mitigação de obrigações tributárias, a assistência direta à população, a Estados e a municípios e a flexibilização das obrigações trabalhistas. Ele ressalta ainda que é difícil precisar o impacto que essas medidas terão nos cofres públicos, pois tudo depende de fatores imponderáveis e ainda imensuráveis.
Apesar da multiplicidade de variáveis é possível ter uma ideia do tamanho do estrago olhando para dados que já estão disponíveis. Follador cita, por exemplo, que o valor que se projetava economizar com a reforma da Previdência, em 10 anos, era de R$ 850 bilhões por ano, sendo que a maior parte desse valor somente seria economizada no final desse período. No entanto, só o custo com o pagamento do auxílio emergencial poderá superar os R$ 200 bilhões. E os gastos com os repasses diretos da União a Estados e Municípios será de R$ 60 bilhões. “Isso significa que, mesmo sem considerar a redução da arrecadação, em menos de meio ano, perdeu-se quase um terço do valor que se estimava economizar em uma década”, explica o advogado.
Além do limite do suportável
Ao considerar a notória indisposição do Estado brasileiro em reduzir seu custo, bem como as amarras legais que moldam o perfil do endividamento público, para Follador parece ingênuo supor que a conta da Covid-19 não chegará, cedo ou tarde, para a sociedade civil, em especial, às empresas e consumidores.
Reforma tributária
“Acredito que no próximo ano se lançarão efetivamente as bases para obter, alguma simplificação do sistema tributário brasileiro com a Reforma Tributária. Isso, por si só, já é meritório, em razão da carga tributária no Brasil, que hoje se ombreia à de países desenvolvidos, o custo administrativo que as empresas têm para cumprir com as obrigações tributárias, medido pelo tempo despendido para entender à caótica legislação, apurar os tributos e pagá-los, não tem paralelo em nenhum outro lugar do mundo”, argumenta Follador.
Segundo a Endeavor, organização de apoio ao empreendedorismo e a empreendedores de alto impacto, a simplificação tributária é urgente porque o Brasil é o pior País em tempo gasto por empresas para pagamento de tributos. Em 168 países, bens e serviços são tributados por um imposto único. No Brasil, são usados cinco tributos diferentes. “Tanta complexidade afeta o crescimento das empresas e do País. Em um sistema mais simples, as empresas podem produzir mais e melhor com menos custos, gerando desenvolvimento e renda”.
E, qual a reforma que o Brasil necessita? Na opinião da Endeavor o País precisa de um sistema simples, justos, e transparente:
Simples – para que empreendedores possam investir tempo e dinheiro no que realmente importa: inovar, crescer e gerar empregos e desenvolvimento para o País.
Transparente – para que a discussão seja honesta e baseada em dados e fatos; e que o novo sistema seja um modelo de cidadania, em que nós sabemos quanto, para quem e por que pagamos nossos tributos.
Justo – para que o sistema reduza desigualdades por meio de instrumentos mais efetivos e focados em quem mais precisa.
De acordo com o contador especialista em legislação tributária com MBA em Administração Financeira e Orçamentária e contribuidor de projetos na Receita Federal, Leonel Siqueira, gerente tributário da Synchro, o texto da reforma tributária é muito bom, mas é na prática que as empresas vão vivenciar seus impactos.“É preciso esperar pra ver, nem sempre a realidade segue as tendências”.
Para ele, todas as propostas de Emenda Constitucional precisam ser muito bem pensadas, pois abordam temas sensíveis à nossa legislação como os discutidos pela PL nº 3887 – CBS que simplifica PIS e Cofins com alguns ajustes em seu texto, sobretudo para aprofundar mais a proposta da alíquota básica de 12%. “Penso ainda que, ainda que o impacto da redução não seja tão considerável quanto da simplificação dos processos tributários, já seria de grande auxílio como nas propostas das PECs 45 e 110, a primeira mais agressiva do que a segunda, em termos de incentivos fiscais às empresas”.
Constituição
Já Paulo Vieira da Rocha, sócio do escritório VRBF Advogados, doutor e mestre em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela USP, a reforma tributária que está sendo discutida em Brasília é um assunto complexo. A maioria das propostas de reforma tributária que está em jogo se baseia em alterações constitucionais e, por consequência, implicam em alterações de leis ordinárias e leis complementares. “Então não se trata de uma única lei alterando todo o sistema tributário. Se for aprovada uma das propostas que se baseiam em alteração da Constituição, será preciso alterar muita coisa da Constituição para baixo”.
Os autores dos projetos em pauta afirmam que a mudança será simples e passível de ser adotada num curto espaço de tempo. Será que podemos realmente acreditar nisso? Para Rocha, coordenador de um programa de pós-graduação no Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT se, de fato, uma verdadeira reforma ocorrer, é muito pouco provável que tenhamos uma transição rápida e simples. “Ao contrário, tende a ser um enorme e longo desafio qualquer transição. Mas acho que é um desafio necessário de ser encarado”.
Ao ser questionado se a reforma tributária é capaz de dar um ‘fôlego’ às empresas e à sociedade brasileira, ele ressalta que o maior problema do Brasil não é o tamanho dos tributos, a carga em si, mas sua completa falta de sistematicidade, sua complexidade, sua incoerência, sua regressividade, sua ineficiência, sua insegurança jurídica e seu excesso de obrigações acessórias. A pandemia só expos isso ainda, contudo não é ela a causa da crise que vivemos”.
Fonte: SIQUEIRA, Leonel. As perspectivas da reforma tributária para 2021. Mensário do Contabilista, p. 25 e 26, Dezembro, 2020